Vida, paixão, pindaíbas, estéticas abandonadas, estéticas corrompidas, retratos comuns, desejos.

sábado, setembro 23, 2006

Poivre

(Atualizado)
Aí tu me colaste este peitinho em riste à minha boca Fleuret, De um, suguei o visgo apimentado de um molho proibido que preparaste em teus mais recônditos lugares, Você sempre pudica me oferecia o outro, já meio triste e molinho suplicava que lhe provasse, de gota em gota, o anis estrelado e a canela que dele saiam, E um a um fui provando, O outro me roubando, E tu dissestes algo ao meu ouvido... Os dois meu bem... Bolinas os dois e tudo mais, E eu já lânguido e meio perverso te disse que não, e voltei os pés para trás, Comida que muito se mexe no fogo, Se queima, Aí tu veio com aquelas cobranças que nunca tens coragem de fazer vestida, Que eu ainda não havia acabado, E que ainda me dariam certo licor viscoso, Meio apimentado de fato, E tu ainda dizias, Que dessa pimenta que eu gostava, as lágrimas no olho acompanhando a curva de nossos corpos, Aí tu querias aquele grosso leite que tu segregavas pelas glândulas, Queria que eu com a boca a levasse o tal lácteo, Que os dois agora bolinados juntos lançavam-no para fora, Apimentado um, O outro canela e anis estrelado, E tu ias cantando assim uma música louca, Algo em espanhol, Não tinhas bebido naquele nascer do sol, Apenas esse tempero imponderável de nossos corpos, De nossas culinárias bestiais, De suores, e dentes, sulcos e lágrimas, de sangue, de esperma, De nossos sorrisos cínicos ao som do que mesmo? Aquela canção espanhola que tu cantavas aninhada aqui no meio peito? E tu deste a mim a boca para satisfazer teu impulso, O desejo lactante, Aquele gosto de menta que tu mascavas todos os dias, Tu cantavas, E veio aqui aninhar-se, langorosa no meu peito, que nem era tão seguro, Tu dizias que isso te confortava pois dos outros moços tu tinhas medo, Músculos risonhos para degolar-te, Aí tu vieste beijando-me a testa, E sem titubear foi levantando-se na cama para oferecer-me o ventre, Esbarraste o mamilo em meus olhos, Ardeu Fleuret, E eu chorei, E disse a ti já lânguido, Subtraído de minhas forças, Que não poderia, Confesso minha perversidade em negar-te, Tu me oferecias aquela forte conserva de cebolas afim de purificar-me, Eu ainda era puro Fleuret, Não conhecia esse olhar sujo que alguns tem pela paixão chamando-a de luxuria, A minha perversidade nasceu dentro da sua, Dentro de teu falso pudor, Eu é que achava lindo sugar-te o molho proibido de teus peitos, E ainda insatisfeito, Esculpir-te os preciosos, Os dois, Um a um, Com todos as individualidades e preservar cada espaço para os irmãos de leite, Trabalho cinzelado desses e sabia que depois vestida a roupa você negaria tudo, E diria que nada fede mais que dois corpos, Como era mesmo o nome da canção? Liliana Felipe a argentina maluca que cantava, E foi exilada no México por acasião da ditadura militar, Tu começaste a beijar-me os mamilos, E tu cantavas agarrada aos pelos de meu peito, Dizendo que esse meu cheiro de manjericão e tomate lhe inspiravam a fazer um molho com teu leite, Hã, Aí tu tiraste acona num rubro róseo, Ainda cantando e dela com a pontinha dos dedos com estrema delicadeza tiraste a pimenta malagueta de ti, E deste a mim para que pudesse prova-la, Eu chorei, Ardeu Fleuret, Mas o choro de gozo era mesmo de rir Fleuret, Tinha espasmos que pareciam mover o mundo, e mover algo em ti, que também chorava, que também ria, E suados ficamos ali em espelho, e beijava teus ombros e tu o mesmo pra mim, Tateando-se as retinas, Corremos a vida, Espantados ficaram os móveis da casa e se foram, Mas eu com aquela ardência dos diabos pingavam os olhos que sorriam, E nós assim embriagados por esse prato agora frio de fogo e quente de pimenta... Cantávamos nosso instante, essa fração, Chorei... De gozo, como no primeiro dia que provei pimenta lá em Salvador, Eu tinha dez anos e atravessava as passarelas no Rio Vermelho chorando... de gozo... Ao final deste banquete, Conserva de cebola, E o tal viscoso da malagueta que prometeste. Quando chegares já terei ido embora, Não, isso não foi como um tango em Paris, aquele sujeito era um idiota que não saia da padaria, Só conhecia manteiga, As fotos, e as cartas rasguei, Se o molho não fosse proibido eu não iria vagar pela Av. São João antes de me picar desta cidade nojenta, Volte pra sua casa... Fiquei embriagado com essa nossa culinária bestial... Qual era mesmo a canção?

Todo Seu,
Caio
Em algum dia nublado de novembro



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